Campanha Nem um Poço a Mais critica desenvolvimento dependente de óleo e gás, mobilizando diferentes sujeitos contra a expansão petroleira e em defesa dos territórios.

 Será que a sociedade usa o petróleo da maneira sábia? Será que reflete que ele pode faltar para as próximas gerações? Será que sabe o impacto que a dependência dessa riqueza natural vem causando? Para responder perguntas como essas, a “Campanha Nem Um Poço a Mais” vem promovendo debates que visam construir uma mobilização contra a expansão petroleira no país. O ‘I Encontro Norte Capixaba de Educação Popular: Territórios de Utopias e Utopias de Territórios’ foi realizado recentemente no município de Conceição da Barra. Além desse, estão planejados outros eventos na Região Metropolitana e no Sul do Espírito Santo. Os encontros culminarão em um seminário com todos os envolvidos ao final de 2016.

Uma das rodas de diálogo do encontro. (Foto: Flavia Bernardes/FASE ES)

Uma das rodas de diálogo do encontro. (Foto: Flavia Bernardes/FASE ES)

A atividade em Conceição da Barra ocorreu nos dias 30 de abril e 1º de maio, reunindo cerca de 25 pessoas das mais diversas realidades para debater sobre os riscos econômicos, ambientais, sociais e políticos da exploração petroleira a qualquer custo. Durante o encontro, foi possível alinhar uma discussão sobre os “usos absurdos do petróleo”, como nas guerras, no trânsito urbano, nos agrotóxicos que envenenam a comida nos pratos, na geração de lixo e de poluição, assim como na violência causada pelo deslocamento forçado de populações e na inviabilidade da manutenção de suas formas tradicionais de vida. “O meu futuro foi dinamitado. Foi vendido para nós uma face do desenvolvimento. Mas, na prática, a riqueza que tínhamos fugiu de nossas mãos. Hoje ouvimos o povo dizendo que já teve água, gado e galinha. E são muitos os testemunhos desta história”, conta o pescador Benedito Matias Pinto, conhecido também como Seu Bi. Além de pescadores, estiveram presentes quilombolas, trabalhadores rurais sem terra, sindicalistas, estudantes, artistas e ativistas de direitos humanos dos municípios de Conceição da Barra, São Mateus, Linhares, Aracruz e Vitória. Invasão de território Durante o encontro também foi realizada visita na propriedade da família Corumba, que foi invadida por poços da Petrobras. Benedito Alves dos Santos, mais conhecido com Seu Corumba, conta que a empresa chegou na década de 1970, ainda durante a ditadura civil- militar. Por ser uma obra federal, segundo ele relata, sua família teria que permitir a exploração. Caso contrário, a Polícia Federal seria acionada. “Isso foi entre 1973 e 1974, quando meu pai Corumba, de quem eu herdei meu apelido, não teve alternativa”, relembra.

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Seu Corumba e um dos cavalinhos de óleo. (Foto: Flávia Bernardes/FASE ES)

“Hoje, o alimento que se produz aqui [no território invadido pela petroleira] não é bom, o que eu como eu trago de fora. Aqui, tô largando [o cultivo] por conta da Petrobras. Desde que eu processei a empresa eu não recebo mais nada”, afirma Seu Corumba, morador do município de Conceição da Barra, que luta por reparação na Justiça. A área da família possui oito cavalinhos de exploração de petróleo que inviabilizam seu modo de vida tradicional. Seu Corumba protesta por estar impedido de plantar em seu território. Tanto a terra quanto a água estão contaminados pela exploração de petróleo e cada vez mais a crise hídrica é sentida pela população local. Além de visitas em áreas como a de Seu Corumba, os participantes do encontro também foram recepcionados pela Associação de Maricultores de Conceição da Barra (Amabarra). Na ocasião, foi exibido o documentário Vento Forte, produzido por iniciativa da Comissão Pastoral da Pesca (CPP) e utilizado como material da Campanha Nacional pela Regularização do Território Pesqueiro, que mostra a situação de comunidades pesqueiras do país que sofrem com o modelo de desenvolvimento imposto pelo Estado, tão dependente do petróleo. Nos debates que se seguiram, foi possível perceber diversos impactos causados pela exploração petroleira. Esses são sentidos mais diretamente, quando formas de vida são alteradas, como as de pescadores e de quilombolas por exemplo, quanto por populações urbanas, com a contaminação do ar e o aumento da temperatura devido à queima de combustíveis fósseis. Conheça a Campanha ‬A queima de combustíveis fósseis e sua relação com o aquecimento global é um dos temas abordados pela “Campanha Nem um Poço a Mais”, que chama atenção para o fato de a indústria do petróleo ser também financiadora das “falsas soluções para a crise climática”. Dentre elas, estão os chamados mercados de carbono, o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), a iniciativa de Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal (REDD) e os Pagamentos por Serviços Ambientais (PSA). Apesar de ter “nomes bonitos” que passam uma ideia de “sustentabilidade”, Marcelo Calazans, coordenador do programa da FASE no Espírito Santo, explica que essas “saídas” são verdadeiros “negócios do clima”.

Exibição do filme “Vento Forte”. (Foto: Flávia Bernardes / FASE ES)

Exibição do filme “Vento Forte”. (Foto: Flávia Bernardes / FASE ES)

Marcelo fala ainda sobre o objetivo geral da Campanha: “Ela não espera que amanhã o consumo de petróleo mundial seja estancado. ‘Nem um poço a mais!’ significa que não queremos a expansão da sociedade petroleira, não queremos novas licitações e novos poços sendo perfurados. Nem mais famílias tendo o seu futuro dinamitado e o consumo desenfreado e irresponsável do petróleo”. O lançamento da iniciativa, em junho de 2015, reuniu ativistas de diversos estados e até de fora do país. Participaram o Fórum dos Atingidos pelas Indústrias de Petróleo e Petroquímica nas Cercanias da Baía de Guanabara (FAPP-RJ), a Associação Homens e Mulheres do Mar da Baía de Guanabara (Ahomar), Amigos da Terra RS, dentre outros grupos. A ideia é, de forma descentralizada e horizontal, que as mobilizações em torno da Campanha se fortaleçam em outras regiões brasileiras. Marcelo destaca que o atual ciclo petroleiro no Brasil “flexibiliza a legislação e as normas ambientais, persegue lideranças de povos tradicionais, técnicos dos órgãos de regulação, organizações e movimentos sociais”. No Espírito Santo, a iniciativa está sendo levada à frente pela FASE junto a parceiros como a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), a Federação Estadual da Pesca (ES), o Organon (Ufes) e o Movimento Nacional da Pesca e Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP).

[1] Matéria de Flávia Bernardes e Gilka Resende, respectivamente integrantes do programa Espírito Santo e da Comunicação da FASE.

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