Publicado originalmente no Jornal Século Diário em 12/05/2017

por Fernanda Couzemenco

Uma caravana composta por camponeses, pescadoras, marisqueiras e outros impactados pela exploração terrestre de petróleo no Espírito Santo, reunidos na Campanha Nem Um Poço a Mais, foi ao Rio de Janeiro reivindicar o reconhecimento dos passivos socioambientais da atividade e o investimento estatal em outras fontes de energia.

Empunhando cartazes e palavras de ordem, os manifestantes realizaram um ato do lado de fora do prédio da Agência Nacional do Petróleo (ANP), nessa quarta-feira (10), durante a quarta rodada de licitações de acumulações marginais.

Dos nove poços maduros ofertados, oito foram arrematados, sendo dois no Espírito Santo: Garça Branca e Mariricu, ambos em São Mateus, norte do Estado, adquiridos pelas empresas Petrol e a Ubuntu, respectivamente. Campos maduros são aqueles que já estão com capacidade produtiva muito reduzida, no caso desses dois, após mais de trinta anos de exploração pela Petrobras.

“Estamos preocupados com as técnicas que essas empresas pretendem usar. Algumas são semelhantes ao fraking, tão combatido em outras partes do mundo, inclusive no Brasil. O que elas terão de fazer pra tirar as últimas gotas de petróleo desses campos?”, questiona o sociólogo Marcelo Calazans, coordenador da Federação dos Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase) no Espírito Santo, uma das dezenas de entidades que integram a Campanha Nem Um Poço a Mais e participaram dos protestos na ANP.

Segundo o ativista, alguns poços precisam sofrer nova perfuração, para aumentar sua profundidade. Além disso, são abertos poços laterais, de onde se injetam água, areia ou produtos químicos. E por se tratar de um óleo mais denso e mais contaminante, são excretados muitos metais pesados e até material radioativo.

“As empresas que se arriscam a comprar isso estão comprando um gigantesco passivo socioambiental”, destaca, citando casos reais de camponeses que vivem perto do campo de Mariricu, por exemplo, e que relatam inúmeros eventos de dutos que se arrebentam e vazamentos de óleo, gerando impactos ambientais terríveis, que afetam sua subsistência, contaminam a água, entre tantos outros problemas. E nada disso é sequer reconhecido pelo Estado. “A Petrobras quer tentar se livrar desses passivos e se concentrar no mar”, critica Marcelo.

Paralelamente aos protestos dos manifestantes e ao leilão, um vereador fluminense discursou no Plenário da Câmara do Rio de Janeiro em favor da Campanha. Num discurso de oito minutos, Renato Cinco (Psol) citou números alarmantes sobre o agravamento da crise climática, em função da manutenção de uma matriz energética baseada em combustíveis fósseis, como os 250 milhões de refugiados do clima que podem existir até 2050 (visão científica mais otimista) ou a própria extinção da capacidade de sobrevivência humana nos trópicos (visão pessimista).

“Todos aqueles brasileiros e brasileiras que estão apostando que o pré sal vai ajudar no futuro do desenvolvimento do nosso pais, precisam entender (…) [que] não haverá futuro para o Brasil através da exploração do petróleo do pré-sal, porque a exploração do petróleo e do pré-sal vai destruir qualquer possibilidade de nós termos um futuro”, afirmou.